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Bernardo M. de Castro

Psicólogo, mestre e doutor em Letras, com um pós-doutorado em Desenvolvimento Humano e Resiliência e outro em Literatura e subjetividade, ambos na University of Cincinnati. Professor na Fundação Dom Cabral.

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“Ter um livro em casa, em vez de um sofá novo na sala de visitas é um valor. Investir na cultura em vez de luxo pode ser um princípio”

Princípios & Valores

 

Geralmente se encontra nos códigos de ética e nas normas de conduta um item dedicado aos princípios e valores. Assim mesmo, as duas categorias juntas. Isso costuma ocorrer por causa da dificuldade de se reconhecer a diferença entre o que são princípios e o que são valores. Até em cursos e palestras isso é facilmente observado. Outras vezes ocorre porque esses códigos existem somente para constar, não requerem esmero nem comprometimento das empresas.


Entretanto, seja o exercício da liderança, sejam as políticas de promoção da liderança, ambos requerem uma precisão tanto para os termos quanto para suas aplicações.

Conceito Método

 

Embora pareça óbvio, o fundamental é notar que os princípios são o ponto de partida, o núcleo duro das estruturas geradoras de atitudes éticas e as referências que se impõem na seleção das relações sociais e afetivas. Geralmente são inegociáveis ou mudam apenas mediante uma grande reflexão ou uma experiência afetiva intensa.


Os valores são muito mais circunstanciais, necessariamente são determinados pelo encontro com o contexto e com o outro lado da relação. As mudanças de valor podem ser comparadas a qualquer objeto de troca, seja uma moeda (quanto vale o real hoje?), um metal precioso ou, mesmo, um objeto de herança cujo valor é mais afetivo do que objetivo, mas que tem seu valor determinado. Ferdinand Saussure, pai da linguística moderna, ensina que o valor está presente inclusive no caso das palavras. Note-se que na frase “o hábito não faz o monge”, a palavra “hábito” tem valor distinto que em “o monge não faz o hábito”.


Os princípios são o crivo determinante dos valores. Por exemplo, não se pode sustentar o valor de relativizar o racismo ou a homofobia se existe o princípio de que todos merecem respeito e tratamento digno.


Contudo, a existência de princípios distintos pode permitir aparentes inconsistências e contradições. É o caso da negociação com pessoas desonestas, ou percebidas como tal. Se o princípio em questão for a honestidade, não haverá condições para alguma negociação assim. Porém, se o princípio em questão for a dignidade, a negociação com pessoas desonestas pode vir a satisfazer a necessidade de se interceder em prol de indivíduos que não estejam sendo tratados com dignidade.

Em negociações, abrir mão de uma cláusula que não tem impacto financeiro significativo é diferente de abrir mão de uma cláusula que pode levar uma empresa à falência. Nos dois casos ocorre uma transigência, possivelmente apoiada no princípio de considerar a opinião do outro, mas o princípio de garantir a coexistência digna das diversas partes deve ser ativado simultaneamente.

“Muitos conflitos surgem por causa da dificuldade de se esclarecer, para si mesmo, como se dá essa seleção interna dos princípios e a consequente ativação dos valores”

A liderança ética

 

Por isso, é essencial a competência para o alinhamento de valores. A liderança ética implica a competência para um convívio com a diversidade de modo que as partes e o todo saiam ganhando ao mesmo tempo em que abram mão de alguma coisa. Com isso, cada grupo tem seu acervo de valores. Uma vez que os princípios sejam respeitados, é possível garantir um conjunto de valores para a participação de cada grupo, ou se reconhece a impossibilidade de se vincular a um determinado grupo, o que pode resultar sempre em ganho e respeito para todos os envolvidos.


Esse alinhamento de valores pode ocorrer espontaneamente em alguns casos. De fato, há grupos em que os membros compartilham de grande parte de princípios iguais e a interseção dos valores é rica e suficiente. Outras vezes, a nomeação dos valores é um recurso saudável para o balizamento das ações do grupo e das relações internas e externas.

Seria bom que se dedicasse algum tempo no início do funcionamento dos grupos para a definição dos valores a serem adotados e preservados. Isso não é fácil, pois não passa simplesmente pela razão e pela lógica da moral social. É um processo que pode tornar-se delicado e revelador de conflitos fortes e profundos. Por isso é importante que se faça, por pessoas competentes, no início do funcionamento de grupos, principalmente os estratégicos.

Não é raro que valores se tornem princípios. Muitas ideias radicais podem ser demovidas a partir de negociações ou aprendizados que gerem ou fortaleçam alguns valores.


No passado tivemos pessoas que cresceram com as benesses propiciadas pela escravatura e que posteriormente se tornaram abolicionistas, mudaram alguns princípios. Atualmente, sabe-se de pessoas que reorganizaram suas ideias a respeito da vida sexual que achavam correta para seus filhos e filhas em função de o amor ser mais forte do que o preconceito. Outros muitos estão aprendendo que o lucro deve ser um meio, não deve ser um fim.

“Pode-se propor que os princípios estão muito mais relacionados com a moral, e os valores se relacionam mais com a ética”
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